Não é improvável que num mundo onde a imagem corporal e o baixo peso parecem ser tão importantes, sintamos ainda mais “fome”.
Isto porque a fome emocional caracteriza-se por ser, precisamente, uma resposta psicológica a stress e a emoções negativas e não uma resposta adaptativa de supressão da fome fisiológica.
Confusos?! Não é caso para menos! A confusão começa com a ideia de a comida e o ato de comer assumirem funções psicológicas e não físicas, fisiológicas. Por isso, lhe chamamos fome emocional e diferenciamos uma da outra, claramente.
A fome fisiológica é aquela em que as nossas hormonas do apetite (digam “olá” à hormona Grelina!) nos avisam de que precisamos de ingerir alimentos. Elas são produzidas quando estamos de “barriga vazia” e podemos ter sinais físicos como fraqueza, dor de cabeça, tonturas, etc.
A fome emocional não nos transmite estes sinais porque, de facto, o corpo não está desnutrido. São as nossas emoções que, sendo negativas e incómodas, nos fazem buscar conforto na comida que, nos dias de hoje é um bem de fácil acesso, pelo menos no mundo ocidentalizado, e que resulta em gratificação imediata. Ou seja, gera imediatamente sensações positivas de prazer, preenchimento, tranquilidade, que contrariam o mal-estar que está na origem da fome emocional.
Tem “fome, mas só” de bolachas, ou batatas fritas, doces ou salgados? Fome não é certamente … O que se passa consigo é que sente a inquietação de quem precisa de se livrar dos seus sentimentos negativos, causada pelo desconhecimento de como fazer para regulá-los e, simultaneamente, sem conseguir tolerar o desconforto que lhe causam.
É isto que fome emocional significa e é também a resposta para as suas dúvidas acerca das razões pelas quais não consegue fazer dietas e perder peso. Não compreende os seus próprios estados emocionais e, muito provavelmente, tem até algum receio de focar a sua atenção neles e ver com mais clareza de onde é que eles partiram. Isto, por sua vez, impede-a de aprender e pôr em prática estratégias que resultem em bem-estar.
Mais, através desta estratégia de “comer as emoções”, acaba por perceber que se sente ainda pior, com mais dificuldades em lidar com o seu corpo e a sua alimentação e menos confiante nas suas capacidades de fazer algo diferente. Tem sede de mudança, mas a sede “não bate assim” e a mudança parece nunca chegar, ao passo que as emoções negativas se acumulam e o inundam se sentimentos de impotência para lidar com as suas próprias dificuldades.
Claro que nesta fase já não se trata apenas de ter expectativas irrealistas acerca das funções e do poder da comida, ou de não identificar corretamente os seus estados emocionais. Neste momento, já automatizou um comportamento que o(a) faz sentir cada mais ansioso(a), stressado(a) e com baixa autoestima, tornando ainda menos provável que arrisque em novas soluções. Pelo contrário, estes comportamentos automáticos, contribuem cada vez mais para outras dificuldades, como por exemplo, afastar-se das outras pessoas porque se sente confuso(a) e incompreendido(a), ou sentir que existe em si um “lado obscuro” que não pode partilhar com ninguém e do qual se envergonha.
No horizonte deste loop está um vislumbre de si como alguém inferior aos demais, que não é capaz de fazer melhor e nem merece, alguém que deve desistir de dar o seu melhor para perceber o que se passa consigo próprio(a), porque é, na sua perspetiva, um esforço inútil.
Todos vemos na comida, aquele prazer, eventualmente culpabilizante, de nos “premiar” ou “congratular”, num bom dia; e de nos “consolar”, “gratificar”, “compensar”, num mau dia. Tranquilize-se, não é um extraterrestre. É um ser humano neste admirável mundo da gratificação imediata em que as emoções, sobretudo as negativas, não são bem-vindas, e quem se dedica muito a elas pode ser “frágil” ou “emocional”. Quando é que ser emocional se tornou um defeito?!
O mais importante é serenar o “corre-corre” e olhar para estas circunstâncias de frente: será que dei à comida uma função que não consigo exercer sozinho(a) porque não consigo debruçar-me sobre as minhas próprias emoções? Se sim, então provavelmente os alimentos estão emocionalmente sobrecarregados e precisamos de voltar a dar-lhes a função original: combater a fome física. Se sim, isso significa que é importante desenvolver a sua capacidade de olhar para os seus estados interiores. Se sim, coloque a dieta de parte por algum (não muito) tempo e primeiro cuide de neutralizar as emoções negativas que têm boicotado esse processo, sejam elas stress, ansiedade, depressão, zanga, qualquer uma.
Repare genuinamente em si: fome não é, certamente, e as emoções não dão sede.
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