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  • Foto do escritorDiana Cruz

Histórias da psicoterapia: quantas vezes vou-me poder reerguer?

Por mais anos que passem, o tempo e o espaço das psicoterapias nunca se vão tornar neutros, para mim, isso sei. Não há forma de isso poder acontecer porque ali, naquele cantinho, passam-se as conversas, as emoções e os “filmes” da imaginação mais bonitos, mais angustiantes, mais dolorosos, mais esperançosos, da história de algumas pessoas.


Por esse motivo, o meu coração salta de emoção em emoção, todos os dias. E, penso agora num dia em particular, onde o silêncio de uma pergunta se sobrepôs a todo o burburinho que entra pela janela, vindo da avenida movimentada que nos faz companhia, lá em baixo.


“Quantas vezes é que será que me vou conseguir reerguer?... Quantas vezes é que isso será ainda possível?”


Estas perguntas arremessadas pelo ar num tom de dor dilacerante, de quem não sabe se terá já ultrapassado o seu limite possível de resiliência e de energia. Perguntas que me deixaram por momentos sem resposta… “Não sei”, pensava eu. E a verdade é que não sabia mesmo, já que o limite de cada pessoa é realmente tão único e individual, tão dependente de tantas variáveis e de forças que, por vezes, nem a própria pessoa sabe que tem.


Às vezes, muitas, acontece-me isto: querer ter as respostas todas. Mas nem sempre as perguntas carecem de respostas. O que carece, em quem procura a psicoterapia, é a possibilidade de ser visto e ouvido, observado e reconhecido, com toda a atenção e cuidados. As pessoas procuram respostas e muitas delas estão ao nosso alcance, mas respostas não é o que elas mais procuram. Cada ser humano procura sobretudo um espaço só seu, um lugar de intimidade e de serenidade, um lugar onde o mais profundo de si é identificado e acolhido.


Pensei sobre tudo isto, em alguns segundos, e este pensamento permitiu-me quebrar o silêncio: “não sei quantas vezes pode reerguer-se uma mulher, um ser humano, maltratado continuamente por outro ser humano, que não se preocupa por causar tão grande sofrimento. Sei sim, que quando se pergunta isso, se sente no limite das suas forças e na escuridão da sua capacidade de criar soluções”.


Aquela mulher, uma mulher linda, culta, independente, era há anos agredida psicologicamente por um ex-marido narcisista que não a poupava a si nem aos filhos de ambos, da sua agressividade e falta de empatia, constantes. Na maioria dos seus dias, tinha forças para tudo o que as suas responsabilidades implicavam, como tomar conta dos filhos a tempo inteiro, exercer a sua profissão e todas as responsabilidades individuais e familiares, que conhecemos. Mas, por vezes, essa energia parecia traí-la, estava exausta e desencantada com a vida que lhe parecia uma avalanche imparável de dificuldades.


Muitas mulheres, com história de relacionamentos como este, sente isto: que a escolha de se protegerem e protegerem os seus filhos de progenitores tóxicos, egocentrados ou narcisistas, traz consigo uma fatura muito alta a pagar, que as obriga a uma luta constante pela dignidade, amor próprio, sanidade mental, sua e dos seus filhos, quando existem.


A P. reergueu-se daquela vez, e em tantas outras que tenho acompanhado. Estou bastante certa de que se vai reerguer quantas vezes forem necessárias e muitas mais do que aquelas em que eu terei todas as respostas para as suas questões.

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