"Gaslighting" refere-se a uma forma específica de violência psicológica, baseada em táticas de manipulação extremamente envolventes. O abuso emocional é tão intenso que a vítima começa a duvidar do que vê, da sua memória e do seu discernimento. Essa dúvida constante leva-a a questionar tudo o que fez ou disse, até acreditar, de facto, que está a enlouquecer.
Este processo ocorre porque o manipulador mente ou nega factos, distorce memórias, comportamentos e ações da vítima. Além disso, culpa a vítima por situações que não provocou e, frequentemente, responsabiliza-a por ações do próprio abusador, projetando suas falhas para isentar-se de culpas e de responsabilidades na relação.
Com o tempo, e devido à repetição destes padrões, a pessoa manipulada sente-se cada vez mais confusa, cheia de dúvidas e emocionalmente desequilibrada. Tanto homens quanto mulheres vítimas de gaslighting podem desenvolver sintomas de ansiedade, perda de autoestima e dificuldade em determinar os seus próprios limites.
Exemplos Reais: reconhecer o Gaslighting
No consultório, frequentemente recebo pessoas que descrevem situações e perguntam: "Será que estou errado(a)?" ou "Estou a ser demasiado exigente por achar esta atitude injusta?". Na maioria dos casos, percebo que estão a ser perfeitamente razoáveis e sensatos, mas foram levados a acreditar o contrário.
Por exemplo, M., um engenheiro de 35 anos, vive com a namorada há seis meses. Durante uma consulta, ele relatou que ela não tolera que ele "tome a nossa casa como sendo também minha". Segundo ele, isso inclui situações como:
Não poder descarregar o autoclismo à noite.
Não poder usar a sua escova de dentes elétrica.
Não pode fazer barulho enquanto cozinha.
Ser impedido de usar a sala porque ela prefere trabalhar sozinha, forçando-o a passar o dia no quarto ou fora de casa.
Quando M. tenta dialogar, a namorada afirma que "é tudo sobre ele". Este é um exemplo claro de gaslighting: a namorada projeta para ele as suas próprias ações, sem reconhecer que define regras unilaterais e inflexíveis, ignorando as necessidades dele.
Como Identificar o Gaslighting
Reconhecer comportamentos típicos é o primeiro passo. Algumas frases comuns incluem:
"Estás a imaginar coisas."
"É tudo sobre ti."
"Tens a mania da perseguição."
"Eu fiz porque tu me obrigaste."
"Querido(a), o que se passa contigo? Isso não aconteceu assim."
Além de distorcer culpas e acontecimentos, o manipulador pode:
Desvalorizar as emoções da vítima.
Minimizar ou ridicularizar os seus sucessos.
Usar sarcasmo e comentários passivo-agressivos.
Estes comportamentos destroem gradualmente a autoconfiança e o valor próprio da vítima, tornando-a dependente emocionalmente do agressor e incapaz de tomar as rédeas da sua vida.
Estratégias para Lidar com Gaslighting
Identificação: O primeiro passo é reconhecer o que está a acontecer.
Registar acontecimentos: Toma notas sobre situações importantes e as suas interpretações. Isso ajuda a validar as suas perceções e reforçar a sua autoconfiança.
Manter uma rede de apoio ativa: Amigos e familiares podem ajudar a manter contacto com a realidade e reduzir dúvidas sobre o nosso julgamento.
Invistir em autocuidado: Práticas que promovam o bem-estar ajudam a fortalecer a resiliência emocional.
Defina limites claros: Aprenda a dizer "não" e proteja os limites essenciais para o nosso bem-estar.
Não tentar convencer o agressor: Tentar provar a verdade é desgastante e frequentemente infrutífero.
Distanciar-se emocionalmente: Embora seja um processo desafiador, o desapego emocional pode diminuir o impacto da violência psicológica.
Reavaliar a relação: Se identificarem que estão numa relação tóxica, considere afastar-se. Procure apoio especializado se necessário.
Por fim, lembre-se: pedir ajuda não é fraqueza, mas sim um ato de coragem e amor-próprio. Cuide de si e permita-se viver relações que respeitem o seu valor.
댓글